Ventos de Teerã

Na entrevista concedida ao GLOBO e publicada na sexta-feira 25, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, aproveitou para reafirmar a defesa brasileira de seu novo aliado preferencial, o Irã de Mahmoud Ahmadinejad. Por uma dessas trapaças do destino — mas que não pode ser creditada ao azar —, logo no domingo o regime dos aiatolás protetores do radical presidente iraniano, reeleito numa eleição fraudada, começou a desfechar nova onda de repressão à oposição interna, a mais violenta desde as manifestações ocorridas depois de anunciada a vitória contestada de Mahmoud Ahmadinejad.

Como o Irã foi tomado por uma atmosfera política inflamável, qualquer fagulha ameaça deflagrar explosões incontroláveis. Editorial O Globo

A nova leva de protestos começou dias antes, com a morte de um dos clérigos dissidentes, o aiatolá Hossein Ali Montazeri. E, ao manter a repressão nas ruas em um importante feriado religioso, o regime jogou mais combustível neste incêndio. Ler a entrevista do chanceler brasileiro enquanto se acompanha o noticiário de Teerã é esclarecedor, para se ter medida dos riscos que a diplomacia brasileira corre ao abrir um guarda-chuva sobre uma ditadura teocrática metida numa aventura nuclear — tudo em nome de um antiamericanismo de ocasião, provavelmente para Brasília, em período eleitoral, afagar frações aliadas mais à esquerda. A perigosa aventura de Ahmadinejad, sob a proteção do aiatolá Ali Khamenei, é defendida por Amorim com o malandramente falso e cândido argumento de que quem tem arsenais deste teor não pode criticar o Irã (EUA, Rússia etc.). O argumento cabe no figurino ideológico bolivariano do caudilho Hugo Chávez. Uma coisa são nações que saíram da Guerra Fria com estes arsenais, mas que participam dos fóruns que tratam do assunto, e negociam acordos de redução no número de ogivas; outra, um país subjugado por uma ditadura de fanáticos religiosos, à margem de qualquer respeito à diplomacia multilateral.

Caso a situação política interna no Irã rume para a ruptura institucional, desaguando num massacre interno, o Brasil irá à ONU defender aiatolás corruptos, sanguinários, fanáticos e sua guarda pretoriana? A julgar pelo silêncio de Amorim, na entrevista ao GLOBO, quando perguntado sobre a leniência brasileira com relação a Cuba, é provável que isto ocorra, infelizmente. Aliás, é o que o Itamaraty tem feito quando se abstém de condenar nas Nações Unidas governos marginais como o do Sudão, em busca de votos para conseguir um assento no Conselho de Segurança.

Essa clivagem ideológica acentuada da diplomacia apenas sabota o projeto do próprio governo de elevar o status do país como parceiro global confiável. Os terceiromundistas, bolivarianos e defensores de Ahmadinejad estacionaram um poderoso carro-bomba dentro deste projeto.


OPOSIÇÃO ACUSA TEERÃ DE ESCONDER CORPO DO SOBRINHO DE MOUSAVI
Para manifestantes, governo teme mais protestos; regime afirma ter levado cadáver para autópsia

Um dia após os piores confrontos entre manifestantes antirregime e forças de segurança no Irã desde o pleito de junho, a oposição denunciou ontem o "desaparecimento" do corpo do sobrinho do candidato derrotado Mir Hossein Mousavi, morto na véspera, e a detenção de sete oposicionistas.

Teerã negou o sumiço do corpo de Ali Mousavi do hospital em que se encontrava, alegando tê-lo levado para análise da causa da sua morte -assim como das outras vítimas.

Na véspera, Teerã atribuíra a sua morte a "atacantes desconhecidos" e, ontem, negou estar escondendo o seu corpo.

Reza Mousavi acusou o governo iraniano de fazer sumir o corpo do seu irmão, Ali, durante a noite. Para os opositores, Teerã teme que um cortejo fúnebre ou mesmo a localização do sobrinho do líder reformista sirva de pretexto para uma nova rodada de manifestações.

Durante o dia, forças de segurança dispersaram com bombas de gás lacrimogêneo um princípio de aglomeração de opositores em frente ao hospital no qual se acreditava que o corpo de Ali Mousavi estivesse.

O governo do Irã confirmou ontem a morte de oito pessoas durante os protestos de domingo, mas negou a autoria. O número de vítimas é o maior em um só episódio desde a reeleição de Mahmoud Ahmadinejad -estopim dos levantes no país.

Nos confrontos que resultaram na morte de Ali Mousavi foram presas 300 pessoas, e, segundo o governo, "dezenas de membros das forças de segurança" ficaram feridos -inclusive o chefe da polícia de Teerã.

Ontem, sites opositores responsáveis pela quase totalidade dos relatos dos confrontos da véspera acusaram Teerã de prender três próximos auxiliares de Mousavi, dois membros da fundação dirigida pelo ex-presidente reformista Mohammad Khatami, o ex-chanceler Ebrahim Yazdi e o ativista de direitos humanos Emad Baghi.

Já o também candidato opositor derrotado no pleito de junho Mehdi Karroubi acusou o governo de agir como a ditadura do xá, deposta pela Revolução de 1979, e questionou a morte de iranianos na data de Ashura, sagrada para xiitas.

Governistas linha-dura, por sua vez, manifestaram ontem apoio ao regime e defenderam o endurecimento da repressão.

Teerã confirmou também a prisão de um jornalista sírio de 27 anos da TV Dubai, segundo colega que pediu anonimato. - Com agências internacionais – O Globo

Um comentário:

Unknown disse...

Feliz Ano Novo!!!

bjs